Quase todos os portugueses sofrem de pleonasmite, uma doença
congénita
para a qual não se conhecem nem vacinas nem antibióticos.
bastante) quem convive com o paciente. O sintoma desta
doença é a
verbalização de pleonasmos (ou redundâncias) que, com o
objectivo de
reforçar uma ideia, acabam por lhe conferir um sentido quase
sempre
patético. Definição confusa? Aqui vão quatro exemplos óbvios
“Subir
para cima”, “descer para baixo” , “entrar para dentro” e
“sair para
fora”. Já se reconhece como paciente de pleonasmite? Ou
ainda está em
fase de negação? Olhe que há muita gente que leva uma vida a
pleonasmar sem se aperceber que pleonasma a toda a hora. Vai
dizer-me
que nunca está atento aos “pequenos detalhes”? E que nunca
partiu uma
laranja em “metades iguais”? Ou que nunca deu os “sentidos
pêsames” à
“viúva do falecido”? Atenção que o que estou a dizer não é
apenas a
minha “opinião pessoal”. Baseio-me em “factos reais” para
lhe dar este
“aviso prévio” de que esta “doença má” atinge “todos sem
excepção”. O
contágio da pleonasmite ocorre em qualquer lado. Na rua, há
lojas que
o aliciam com “ofertas gratuitas”. E agências de viagens que
anunciam
férias em “cidades do mundo”. No local de trabalho, o seu
chefe
pede-lhe um “acabamento final” naquele projecto. Tudo para
evitar
“surpresas inesperadas” por parte do cliente. E quando tem
uma
discussão mais acesa com a sua cara-metade, diga lá que às
vezes não
tem vontade de “gritar alto”: “Cala a boca!”? O que vale é
que depois
fazem as pazes e vão ao cinema ver aquele filme que “estreia
pela
primeira vez” em Portugal. E se pensa que por estar fechado
em casa
ficará a salvo da pleonasmite, tenho más notícias para si.
Porque a
televisão é, de“certeza absoluta”, a “principal
protagonista” da
propagação deste vírus. Logo à noite, experimente ligar o
telejornal e
“verá com os seus próprios olhos” a pleonasmite em directo
no pequeno
ecrã. Um jornalista vai dizer que a floresta “arde em
chamas”. Um
treinador de futebol queixar-se-á dos “elos de ligação”
entre a defesa
e o ataque. Um “governante” dirá que gere bem o “erário
público”. Um
ministro anunciará o reforço das “relações bilaterais entre
dois
países”. E um qualquer “político da nação” vai pedir um
“consenso
geral” para sairmos juntos desta crise. E por falar em
crise! Quer
apostar que a próxima manifestação vai juntar uma “multidão
de
pessoas”? Ao contrário de outras doenças, a pleonasmite não
causa
“dores desconfortáveis” nem “hemorragias de sangue”. E por
isso
podemos “viver a vida” com um “sorriso nos lábios”. Porque
alguém a
pleonasmar, está nas suas sete quintas. Ou, em termos mais
técnicos,
no seu “habitat natural”. Mas como lhe disse no início, o
descontrolo
da pleonasmite pode ser chato para os que o rodeiam e nocivo
para a
sua reputação. Os outros podem vê-lo como um redundante que
só diz
banalidades. Por isso, tente cortar aqui e ali um e outro
pleonasmo.
Vai ver que não custa nada. E “já agora” siga o meu
conselho: não
“adie para depois” e comece ainda hoje a “encarar de frente”
a
pleonasmite! Ou então esqueça este texto. Porque, afinal de
contas, eu
posso estar só “maluco da cabeça”!
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